FPA defende pacote de segurança no campo para proteger produção e combater avanço de facções

Na semana passada, o país acompanhou estarrecido a realização da Operação Contenção que teve como alvo o crime organizado no Rio de Janeiro, em especial o Comando Vermelho.
Quase uma semana após a megaoperação que deixou 121 mortos nos complexos do Alemão e da Penha, a Polícia Civil do Rio divulgou uma lista com 115 perfis —que não inclui os quatro agentes de segurança que perderam a vida na ação.
Todos os civis mortos durante o confronto com a polícia nos complexos da Penha e do Alemão e já identificados são homens. A média de idade é de 28 anos e 1/3 deles não tem registro do nome do pai. A metade possuía ao menos um mandado de prisão ou, no caso de um menor de idade, de busca e apreensão.
A realidade do Rio de Janeiro transcende o conceito tradicional de criminalidade urbana. O que se observa é a formação de Estados paralelos, estruturados sob lógica empresarial, paramilitar e narcoterrorista. Facções e milícias não apenas dominam territórios, mas instituem normas, cobram tributos, impõem leis próprias e controlam a economia subterrânea de centenas de comunidades.
O cenário bélico da Operação Contenção, deflagrada em outubro de 2025, com mais de cem mortos e apreensão de grande quantidade de armamentos e drogas, ilustra a magnitude da crise. O Estado formal perdeu o monopólio da força em amplas áreas, configurando o que a doutrina de segurança internacional denomina "colapso da soberania interna".
Tal contexto evidencia a inadequação de um sistema penal unificado, incapaz de responder a situações extremas com a celeridade e especificidade que o caso exige. A criminalidade fluminense demanda mecanismos processuais próprios, regimes de cumprimento de pena diferenciados e restrições de benefícios penais, como resposta legítima a uma realidade de guerra social.
Em maio deste ano houve uma decisão do Supremo Tribunal Federal, que ordenou providências contra o crime organizado no Rio de Janeiro, respeitando os limites do processo estrutural e promove avanços sem violar o princípio da separação dos poderes.
O Supremo determinou que o estado do Rio e seus municípios elaborem planos de recuperação dos territórios dominados por organizações criminosas e adotem outras medidas de controle da violência policial. A Corte homologou parcialmente o plano de redução da letalidade policial apresentado pelo Executivo estadual na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635.
Processos estruturais são ações nas quais se buscam enfrentar uma violação massiva de direitos que não resulta de um único ato do poder público, mas de um conjunto de ações e omissões de diferentes autoridades e até de diferentes instâncias de governo.
A sua solução de modo geral envolve a reformulação de políticas públicas, por meio da participação de autoridades, beneficiários e sociedade civil. São litígios complexos que envolvem um conjunto amplo de atores.
O que o STF fez na ADPF 635 foi homologar, e não impor unilateralmente, o plano de redução da letalidade policial apresentado pelo estado do Rio de Janeiro. Além disso, a Corte determinou a adoção de medidas complementares, como a elaboração de um plano para a recuperação territorial de áreas ocupadas por organizações criminosas e a instauração de um inquérito, pela Polícia Federal, para apurar indícios concretos de crimes com repercussão interestadual e internacional.
Quanto ao uso da força em operações policiais, a Lei 13.060/2014 regula o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública em todo o território nacional. Estabelece diretrizes para o uso da força e dos instrumentos menos letais, visando garantir a segurança e a proteção dos direitos humanos durante as operações de segurança pública. Além disso, a lei prioriza a utilização desses instrumentos em situações que não exigem o uso da força letal, promovendo uma abordagem mais cautelosa e responsável por parte das autoridades.
Posto isso, passo a minha análise pessoal. Considerando a gravidade da situação em que se encontra o Rio de Janeiro, com verdadeiros estados paralelos que possuem as suas próprias “forças armadas” mais bem equipados e armados que as forças de segurança pública, não é possível esperar leniência dos policiais colocados para tomar o território dos morros de volta ao Estado. Observando as imagens amplamente reproduzidas, se verifica um verdadeiro “matar ou morrer”, de forma que chacina não seria o termo adequado para o confronto violento que se viu.
Ao olhar a imagem de todos aqueles corpos enfileirados em praça pública não é possível não sentir um pesar e pensar no desperdício de uma juventude, considerando a média de idade das pessoas assassinadas, no que levou uma geração de pessoas a procurar no crime o seu futuro que, claramente acabaria em morte ou cadeia. Portanto, não consigo compactuar com quem acredita que houve Justiça.
Os dados das vítimas também nos fornecem uma pista dos aspectos sociais envolvidos, por exemplo abandono afetivo que foi tema da Dra. Elizabeth na semana passada. Neste caso, um terço dos mortos tem sequer registro de pai na certidão, o que significa abandono material, social e psicológico tanto da criança quanto da mãe desta criança que se tornou um adulto adotado pela facção criminosa.
Talvez todos se perguntem por que esse assunto nos interessa? Porque apesar do que muitos pensam, qualquer um que trabalhe na área criminal, tem conhecimento que as facções criminosas são uma realidade no país, inclusive em Santa Catarina. E, talvez possamos tirar lições de como lidar com este problema de forma mais eficiente e, evitar que se chegue a ações tão letais como a que vimos acontecer.
A falha do Estado, no sentido amplo, nessas localidades, desde a prestação de serviços públicos, manutenção e segurança do próprio território, saúde, educação, saneamento básico, condições mínimas foram totalmente negligenciados que deixaram de ser um problema social ignorado e que se tornou um problema policial que não pretende continuar escondido.
Por
Karin Frantz
OAB/SC 22.701
Justiça, Chacina ou Falência do Estado?
O abandono afetivo pode ser indenizado?
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