ELAS & O DIREITO

O abandono afetivo pode ser indenizado?

   

O assunto abandono afetivo é um tema que vem se tornando cada vez mais frequente para sociedade tendo em vista a diversidade familiar atual.

A responsabilidade civil por abandono afetivo ocorre quando o pai ou a mãe negligencia seus deveres parentais, ou seja, falha em prover o cuidado e o afeto devidos ao filho, causando dano moral que pode ser reparado por meio de indenização.

O artigo 227 da Constituição Federal prevê as regras destinadas a proteção da criança e do adolescente:

“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

Esse artigo nos mostra que a paternidade responsável não se limita apenas à concepção biológica ou à obrigação alimentar, mas traz vários deveres fundamentais atribuídos a família tendo como objetivo o desenvolvimento da criança e do adolescente e ainda impõe ao pai e a toda figura parental o dever de participar ativamente da vida da criança, orientando moral e emocionalmente.

A jurista Maria Berenice Dias no livro Manual de Direito das Famílias destaca:

“A paternidade responsável não se esgota no dever de sustento. Pressupõe o pleno exercício das funções parentais, com presença afetiva, participação na criação e desenvolvimento do filho, além da garantia de convivência e orientação. O abandono afetivo, quando reiterado e injustificado, viola direitos fundamentais da criança e enseja a reparação”.[1]

Mas, no dia a dia temos visto justamente o contrário – pais que abandonam seus filhos na questão financeira e não pagam pensão alimentícia, não se preocupam com o filho e quando são cobrados judicialmente apelam para dramas e até mesmo ameaças.

Ou então, pagam a pensão alimentícia e acham que com isso estão cumprindo com todas as suas obrigações, mas abandonam afetivamente, ignorando as necessidades psicológicas da criança.

O abandono afetivo é tão grave quanto o abando financeiro pois, mesmo que a criança ou o adolescente receba do genitor, economicamente falando, o necessário para ter uma vida digna, não é o bastante. Já que o menor necessita de amor e carinho tanto quanto necessita de dinheiro para seu sustento, visto que, ele pode crescer com os melhores bens materiais, mas não tem o afeto que precisa do genitor para crescer de maneira saudável.

Alguns tribunais já têm reconhecido o direito à indenização pelos danos morais decorrentes do abandono afetivo, representando um avanço na proteção das relações familiares. Contudo, a responsabilidade civil por abandono afetivo ainda enfrenta resistência e é objeto de interpretações divergentes nos tribunais.

A Ministra do STJ Nancy Andrighi, afirmou no julgamento do REsp 1159242, condenou um pai ao pagamento de danos morais decorrente do abandono afetivo, com o seguinte fundamento “amar é uma faculdade, mas o cuidar é um dever”.

Para que seja possível mover uma ação de indenização é preciso laudos psicológicos, testemunhas (amigos e professores) que possam falar sobre a ausência do genitor, provas documentais e fotográficas e outros documentos específicos de cada caso.

A indenização pressupõe que haja um dano à personalidade da criança, sendo indiferente se o vínculo entre eles foi rompido ou se nunca existiu. Mas se a pessoa abandonada pelo genitor não sofreu nenhum dano emocional, não há que se falar em indenização, visto que, a indenização só é possível em casos de sofrimento da criança ou adolescente.

O valor da indenização é fixado pelo juiz, considerando as circunstâncias específicas de cada caso. 

Quando um filho procura o Judiciário em busca de uma indenização, ele quer mais do que dinheiro. Aliás o processo e a indenização é o meio que ele encontrou de ser notado pelo genitor. A compensação financeira não será suficiente para apagar o trauma sofrido na infância, mas, oferece, pelo menos, um pouco de conforto psicológico e uma sensação de justiça. 

Elizabeth Petters Guse Schmidt

OAB/SC 23.885

[1] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 14. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021.