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ELAS & O DIREITO

Fofoca e o dano moral

  

Se tem algo que une todas as classes sociais, épocas e culturas, é a boa e velha fofoca. Desde os tempos das cavernas, quando um homo sapiens comentava sobre o comportamento estranho do vizinho da caverna ao lado, até os grupos de WhatsApp de família, a fofoca sempre esteve presente na vida humana. Mas o que o Direito tem a dizer sobre isso?

o que é a fofoca e por que gostamos tanto dela?

Antes de mergulharmos no Direito, precisamos entender o que é a fofoca. O sociólogo Erving Goffman já dizia que a vida em sociedade é um grande teatro e que todos desempenhamos papéis sociais. Ora, se a sociedade é um teatro, a fofoca é a crítica de bastidores!

Já Michel Foucault, ao estudar o poder e o discurso, mostrou como o controle da narrativa influencia as relações sociais. A fofoca, nesse contexto, é um instrumento de poder, pois quem controla a informação controla a percepção sobre os outros.

Do ponto de vista evolucionista, o antropólogo Robin Dunbar propôs que a fofoca tem uma função social essencial: manter a coesão dos grupos e regular comportamentos desviantes. Ou seja, fofocar não é só entretenimento, é uma necessidade social!

a fofoca e o direito: até onde vai a liberdade de expressão?

No Brasil, a liberdade de expressão é garantida pelo artigo 5º, inciso IV, da Constituição Federal, que diz que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. Mas será que isso significa que podemos sair por aí falando o que quisermos sobre os outros? Claro que não!

A fofoca pode esbarrar em outros direitos fundamentais, como o direito à honra, à privacidade e à imagem, previstos no artigo 5º, inciso X, da Constituição. Isso significa que, dependendo do que for dito e das consequências, a pessoa pode ser responsabilizada.

O Código Civil, em seu artigo 186, determina que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Assim, se uma fofoca causar prejuízos à reputação de alguém, pode gerar indenização por danos morais.

Além disso, o artigo 927 do Código Civil reforça que “aquele que causar dano a outrem é obrigado a repará-lo”. Ou seja, se a fofoca ultrapassar o limite da mera conversa de comadres e se transformar em um ataque à honra, a pessoa que espalhou a informação pode ter que pagar uma indenização.

Quando a Fofoca Vira Crime?

Fofocar não é crime por si só, mas algumas fofocas podem se encaixar em tipos penais previstos no Código Penal. Vamos aos principais:

Calúnia (art. 138 do Código Penal) – Quando alguém acusa falsamente outra pessoa de um crime, sabendo que isso não é verdade. Exemplo clássico: "Ouvi dizer que fulano roubou dinheiro da empresa!", sem qualquer prova.

Difamação (art. 139 do Código Penal) – Quando alguém espalha uma informação negativa sobre outra pessoa, que pode manchar sua reputação, mesmo que seja verdade. Exemplo: "Ciclano traiu a esposa com a vizinha!", dito sem necessidade.

Injúria (art. 140 do Código Penal) – Quando a fofoca atinge diretamente a dignidade de alguém, como xingamentos e insultos. Exemplo: "Beltrano é um incompetente!"

Ou seja, aquela velha frase “se não tem nada de bom para falar, é melhor ficar calado” pode ser um ótimo conselho jurídico.

Os tribunais brasileiros já analisaram diversos casos sobre a fofoca e existem dois possíveis resultados, analisadas as provas de cada caso:

Uma mera "fofoca" entre dois conhecidos, conquanto possa configurar conduta moralmente reprovável, mas realizada sem maiores repercussões, não passa de um (infeliz) dissabor inerente à vida em sociedade, a ponto de caracterizar violação à honra da parte referida, não ensejando o ato, de ilicitude duvidosa, a possibilidade, por si só impor o dever de reparação civil a título de danos morais.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a disseminação de informações falsas, ainda que por redes sociais ou aplicativos de mensagens, pode gerar indenização se causar prejuízos à reputação da vítima. O dever de respeito ao direito do outro conduz ao de responder nos casos em que, mesmo no exercício de direito legitimamente posto no sistema jurídico, se exorbite causando danos a terceiro. Quem informa e divulga informação responde por eventual excesso, apurado por critério que demonstre dano decorrente da circunstância de ter sido ultrapassada esfera garantida de direito do outro.

A liberdade de imprensa - embora amplamente assegurada e com proibição de controle prévio - acarreta responsabilidade posterior pelo eventual excesso e não compreende a divulgação de especulação falsa. Gera dano moral indenizável a publicação de notícia sabidamente falsa, amplamente divulgada, a qual expôs a vida íntima e particular dos envolvidos. Os valores arbitrados devem levar em consideração a proporcionalidade e a razoabilidade entre o dano e prejuízo causado.

E quando a postagem for anônima?

O provedor de conteúdo, rede social ou outro ao ser comunicado de que determinado texto ou imagem possui conteúdo ilícito, deve agir de forma enérgica, retirando o material do ar imediatamente, sob pena de responder solidariamente com o autor direto do dano.

Ao oferecer um serviço por meio do qual se possibilita que os usuários externem livremente sua opinião, deve o provedor de conteúdo ter o cuidado de propiciar meios para que se possa identificar cada um desses usuários, coibindo o anonimato e atribuindo a cada manifestação uma autoria certa e determinada.

Sob a ótica da diligência média que se espera do provedor, deve este adotar as providências que, conforme as circunstâncias específicas de cada caso, estiverem ao seu alcance para a individualização dos usuários do site, sob pena de responsabilização através de compensação financeira.

Então, se você gosta de uma fofoca, cuidado! O que começa como um bate-papo inocente pode acabar no tribunal e acabar custando muito caro.

Karin Frantz

OAB/SC 22.701

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