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ELAS & O DIREITO

Caso Daniel Alves – E você, se sente segura?

  

Na última sexta-feira (28/03/2025) os jornais do mundo inteiro noticiaram a nova decisão no processo em que o jogador de futebol Daniel Alves foi inocentado das acusações do crime de estupro.

Um processo que teve repercussão mundial e tramita em segredo de justiça, que nos permite apenas tecer comentários com base nas notícias sobre o caso, sem que isso nos impeça de nos revoltarmos.

O jogador havia sido condenado a 4 anos e 6 meses de prisão  por "agressão sexual", um crime que na Espanha é equivalente ao que é considerado o estupro no Brasil. No entanto, depois de um recurso apresentado pela defesa, o Tribunal Superior de Justiça da Catalunha anulou o veredito, dizendo que o depoimento da denunciante não era confiável. Afirmou ainda que a decisão original sobre o caso apresentava "lacunas, imprecisões, inconsistências e contradições quanto aos fatos".

O principal ponto da nova decisão é que, diferente da sentença anterior, não haveria como, apenas com o depoimento da vítima, decidir se houve ou não consentimento.

Ou seja, o tribunal não está afirmando que a versão de Alves, de que não houve estupro seja a correta. Mas argumentam que também não podem aceitar a hipótese da acusação como provada com base apenas nas palavras da vítima.

Ainda cabe recurso da decisão perante a Suprema Corte da Espanha e seguimos na esperança de ver essa decisão reformada.

Mas, é possível afirmar sem medo de errar que essa decisão é um retrocesso.

É um retrocesso, tanto do ponto de vista jurídico quanto social, pois os crimes sexuais não são praticados em público ou com testemunhas. Eles são praticados dentro de casa, em lugares escondidos, longe de câmeras, no apagar das luzes, protegidos pela escuridão.

E o depoimento da vítima é de extrema importância para o desenrolar do processo e a condenação do agressor. A doutrina e a jurisprudência no Brasil, tem entendido que a prova testemunhal da vítima nos crimes de estupro tem que ter maior valor, desde que harmônica e coesa ao caso concreto.

Mas mesmo assim quantas mulheres deixam de denunciar as agressões sexuais que sofreram por vergonha e por medo de não serem ouvidas e acolhidas.

Como mulher, é impossível não se sentir duplamente vulnerável, primeiro por não sabermos onde e com quem estamos de fato seguras e, em segundo lugar – a falta de credibilidade dada a palavra da mulher, seja pela polícia, seja pelo Poder Judiciário.

Essa decisão da justiça espanhola nos mostra que essa postura de colocar a palavra da mulher em cheque não é privilegio da justiça brasileira.

O caso ganhou tamanha repercussão por se tratar de um jogador de futebol famoso.

Mas quantos casos acontecem debaixo dos nossos olhos todos os dias?

As estatísticas escancaram uma triste realidade – a cada 8 minutos uma pessoa é estuprada no Brasil. E o que torna isso mais assustador é que 60% das vitimas tem menos de 13 anos de idade.

O crime de estupro no Brasil está previsto nos artigos 213 e 217-A do Código Penal e a pena varia de 6 a 30 anos de reclusão. Sendo que as maiores penas são previstas para os casos que envolvem menores de 14 anos, vulneráveis e nos casos em que o estupro resulta em morte.

No dia a dia temos visto decisões com condenações de em média 13 anos de reclusão. Mas ainda estamos longe de punir todos os criminosos que praticaram crimes sexuais.

No caso Daniel Alves a boate onde ocorreu o caso de violência sexual seguiu um protocolo chamado “No Callem” (Não se calem, em tradução livre), criado em 2018 em Barcelona para combater assédio ou violência sexual e para proteger a vítima. Essa resposta da equipe da boate inspirou a aprovação de uma lei, no Brasil, que prevê a aplicação do protocolo "Não é Não".

A lei brasileira foi aprovada em 2023 - Lei nº 14.786, e cria regras que estabelecimentos como bares e casas de show devem seguir para prevenir violência contra a mulher e proteger vítimas, inclui treinamento de funcionários e acionamento da polícia.

Essa lei é um avanço na proteção e amparo as vítimas, mas ainda estamos longe de um cenário ideal. A conscientização sobre violência sexual e a demanda por mudança de cultura e de comportamento precisa ser constante de desprovida de preconceitos ideológicos e religiosos.

Isso pode ser facilmente compreendido pelas pessoas, uma vez que há poucas semanas o sentimento de insegurança aterrizou mulheres da nossa pacata cidade com um agressor sexual a solta.

Enquanto isso vivemos um sentimento de insegurança que paira sob nossas cabeças, precisando sempre cuidar com a roupa que vestimos, os lugares que frequentamos e as pessoas em que confiamos.

Elizabeth Petters Guse Guse Schmidt - OAB/SC 23.885

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