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Posso usar drogas?

Toda semana passamos por um desafio ao escrever a coluna semanal. É preciso dosar a moralidade com a legalidade. E nisso, o texto acaba redundante no sentido de colocar a família como o cerne de todas as questões. Calma, chegaremos lá.

O Supremo Tribunal Federal decidiu no dia 25 de junho pela descriminalização do porte de drogas. A Lei 11.343 de 2006, instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad; que prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes. Ou seja, a lei distingue o usuário e o traficante já na sua ementa.

Quando falamos em legislação, há uma forma, como um esqueleto, que direciona a lei. São os títulos, os capítulos, às vezes, seções e por fim os artigos. Assim, se abordam temas gerais, princípios, aspectos administrativos para depois tratar crimes, penas, execução da lei e das penas.

Falando na lei antidrogas, há um capítulo na lei que estabelece formas de prevenção do uso indevido de drogas que inclui diversos aspectos tais como investimento em alternativas esportivas, culturais, artísticas, profissionais, entre outras, como forma de inclusão social e de melhoria da qualidade de vida, programas pedagógicos (quem lembra do PROERD?). Também, a lei propõe formas de acolhimento, tratamento pelo SUS, internação, com cuidados tanto para o usuário como para os familiares. Percebe-se que o legislador em todo o texto da lei tratou o usuário como dependente e não como criminoso. Isso, desde 2006.

Já, a partir do artigo 27 que é o capítulo III dos crimes e das penas, no artigo 28 se estabelece: “Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.”

Exatamente neste artigo, 28, que o STF deliberou. Isto porque ele é o órgão que trata da constitucionalidade das leis.

Em sua maioria, os Ministros entenderam que o porte para consumo pessoal não é considerado crime, mas sim ato ilícito sem natureza penal (sui generis). A própria lei, escrita lá em 2006, trata exatamente assim. Confesso que já fiz algumas audiências, quando era assessora de magistrado, chamadas de audiências de admoestação verbal para usuários de entorpecentes. E a audiência é, basicamente, um sermão sobre o uso de entorpecentes e o resultado disso na vida, logo ali adiante. E antes que me perguntem, você é a favor do uso da maconha? De forma alguma. Mas o Estado não pode cuidar de tudo e, neste caso, cuida de forma amena, quase nula. Nisso, considero-me libertária. Cada um tem que saber de si, até mesmo porque 31% dos encarcerados brasileiros são presos por tráfico de drogas. Isso revela que combatemos a consequência e não as causas do problema.

Algumas leis, feitas por políticos que em muitas vezes não possuem formação adequada, acabam por tratar alguns temas que precisam ser reexaminados pelo Judiciário e dali resulta uma ‘interpretação conforme’ (exatamente isso).

No voto do Dias Tóffoli, que estava com vista do processo, destacou que “O legislador tentou diferenciar grandes traficantes, pequenos traficantes e usuários, mas falhou em fornecer critérios objetivos, resultando em condenações injustas”. Ou seja, no caso do artigo 28 o STF entende que não há a descrição de um crime, por isso, considera descriminalizar porque os incisos do artigo propõem medidas sem efeito penal, apenas uma sanção com finalidade educativa.

Em resumo, a lei não mudou absolutamente nada, porém, a interpretação para o artigo 28 que trata do usuário fica entendida como ação educativa aos usuários e não repressiva, uma ação psicossocial que já é desenvolvida assim. Se não há pena de prisão ou detenção, não é crime. E em nada muda a legislação. NÃO ESTÁ LIBERADO O USO DE DROGAS EM LOCAIS PÚBLICOS e o uso ainda é tratado como ‘dependência’ sob as medidas previstas no dito artigo.

O STF não está legislando e inclusive deverá recomendar ou pelo menos por jurisprudência criar orientação para diferenciar quanto é uma quantidade que deverá ser entendida como porte, pois não há critérios objetivos para essa distinção na lei.

E vejam só, a lei antidrogas ainda prevê Semana Nacional de Políticas sobre Drogas, comemorada anualmente, na quarta semana de junho, ou seja, nesta semana... já é sexta feira e não vi absolutamente nada sendo feito nem pelos municípios nem pelo Estado. Vocês ouviram algum debate sobre o assunto ou alguma campanha em maior escala dentro de nossos municípios.

Entretanto, desde o ano passado, pelo menos em Ascurra (e, confesso, não busquei saber sobre Rodeio e Apiúna), o município, já que não é mais contemplado com o PROERD (programa da Polícia Militar) por falta de contingente, promove o “Programa Escolha Certa” – Programa Educacional de Consciência Cidadã e Prevenção à Criminalidade que trabalha de forma um pouco mais abrangente questões de conscientização social e combate às drogas para estudantes do 5º ano. Quem custeia o programa é o município de Ascurra. É exatamente isso que a lei federal propõe. Parabéns, Ascurra!

É verdade que, na grande maioria dos municípios, estados e até a própria união, se finge uma preocupação pública para fomentar políticas públicas que não visam auxiliar nem resolver nada, apenas tratar paliativamente para manter programas e dinheiro focado num círculo vicioso que enriquece exatamente os donos das emendas. Mas tem lugar que faz! E não é tão difícil. Fantástico trabalhar isso nas escolas. Aliás, deveria começar bem mais cedo, não apenas no 5º ano.

De toda forma, como iniciada esta conversa afiada, o que mais verificamos é a ausência das famílias na forja do caráter dos próprios filhos. Boa parte da legislação de drogas, fomenta a busca e a responsabilização da família para combater o uso de entorpecentes. E, claro, verificamos essa falha no primeiro ambiente social de qualquer pessoa: na família. A falta de diálogo, a falta de carinho, a falta de atenção tem jogado as crianças e jovens para uma busca de ‘ser notado’ e fazer isso através de momentos de revolta, de autoflagelação por sentirem-se ‘estorvo’ na família.
A escola ou programas sociais ou até mesmo a Igreja com a catequese não suprirão e nem terão força suficiente para dar aos filhos o que eles mais precisam, pais presentes. E, não falem sem deter conhecimento.

Então posso usar drogas?

O uso de entorpecentes não é seguro e não é, sob qualquer aspecto, recomendável. Lembrem-se, toda escolha tem uma consequência.

Famílias, assumam as rédeas de suas vidas e de seus filhos.

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