Minha cisma

“Fatos são coisas teimosas; e quaisquer que sejam nossos desejos, nossas inclinações ou ditames de nossas paixões, eles não podem alterar o estado dos fatos e das provas”, John Adams.
Inspirado na busca pela verdade efetiva dos fatos, o florentino Maquiavel, ao contrário de outros autores políticos, não considera o tirano como uma forma degenerada de governo - comumente associado à forma corrompida da monarquia (que vivia a Itália na época), mas que o homem de estado e o tirano fazem parte de um mesmo universo, se diferenciando por meio daquilo que é próprio ao homem político: o reconhecimento dos outros homens.
Quando temos ‘homens’ que representam o povo, em nome dos interesses da maioria, esses agem pelo desejo desta maioria do povo justificando, portanto, todas as suas atividades como lícitas.
Maquiavel conclui que as tiranias, no geral, se originam do desacordo entre o desejo do povo de não ser dominado e o desejo da nobreza de dominá-lo, o que promove a instauração de leis e instituições que protejam (ou forjam) a liberdade em controle pelos governantes. Assim, somos dominados por leis e por tiranos sem, muitas vezes, perceber, pois a lei está posta. Por isso, a polarização se tornou um problema, perdeu-se a maioria a justificar as atrocidades governamentais.
O livro escrito pouco depois de os Portugueses terem pisado nesta terra, Discorsi – 1513/1519 – parece mais atual do que nunca. Maquiavel é realista em sua análise da ação política, sua modelagem é baseada na observação empírica dos homens, de suas instituições e nos exemplos históricos. Para ele os governantes não precisam ter virtudes, basta que aparentem ter.
“Todo homem é dúbio, simulador e dissimulador, agindo à maneira da raposa, sua ação é movida ainda pela paixão; mas o príncipe eleva a um outro nível esta duplicidade, ele é grande simulador e dissimulador − entenda-se que ele sabe disfarçar a força na lei, e governar também pela força da lei, dar ao animal uma face humana e reprimir dessa forma o animal no homem”, Maquiavel no livro O Príncipe (1532).
É exatamente o que vivemos em nome de nossa democracia (leiam a coluna da semana passada). A lei disfarça o super poder nas mãos de alguns, ela (a lei) esconde as raposas. Vive-se um autoritarismo travestido de democracia. Porém, alguns tiranos, quando não mais conseguem retornar ao ponto de representar os interesses da maioria do povo novamente, passam a ser dispensáveis em nome da manutenção de ‘salvadores’ maiores da pátria e em nome, sempre, da democracia.
Verdade que nosso sistema representativo é falho desde que nasceu, mas no Judiciário brasileiro, não temos eleições, portanto, é muito mais provável que tiranos se estabeleçam no ‘canetaço’ da lei a favor de quem os colocou lá.
Assim, também passam a ser dispensáveis, pois o ‘grande irmão’ (leiam o livro 1984) precisa, como diz Maquiavel, PARECER bom, justo e correto. Deste modo, é normal nas democracias ‘relativas’ que se corte a cabeça de um para que os outros permaneçam no poder com a aparência do bem.
As mensagens ‘milagrosamente’ vazadas pelo mesmo jornalista da ‘vaza jato’ e que comprovam o que todos já sabiam sobre o Judiciário Brasileiro, tem algum propósito maior (acreditem!). O delator vai sobreviver como herói, mas ele mesmo colocou a raposa lá.
A Suprema Corte e o Tribunal Superior Eleitoral trabalharam em conjunto para a perseguição política e produção de provas. Para quem não é da área jurídica, tenham uma única certeza: O Judiciário é (e deve ser) INERTE! O magistrado (incluindo Desembargadores e Ministros) ficam sentadinhos esperando ser ‘provocados’ através de processos movidos pelas partes – cidadãos comuns por seus advogados ou pelo Ministério Público (ou Procuradorias). Juiz não produz prova! E muito menos fica no Instagram, no Twitter (agora X) ou no TikTok procurando quem processar.
A revelação apresentada no Jornal ‘Folha de São Paulo’ mostra que o Ministro Alexandre de Moraes determinava, extraoficialmente e por WhatsApp, aos seus assessores tanto do TSE quando do STF a produção de provas contra quem apresentasse qualquer discordância consigo ou com a Corte ou duvidasse do sistema eleitoral brasileiro, colocando tudo na conta do tal inquérito das Fake News. Os atos ‘extraoficiais’ são, na verdade, INCONSTITUCIONAIS. Algumas leis disfarçadas de bem em nome da democracia, não foram aprovadas (ainda).
Veja-se que tivemos condenações neste país baseada apenas em conversas em grupo privado de WhatsApp, o que em Direito chamamos de PRECEDENTE que pode embasar novas condenações em mesmo sentido. Será? Alguma cabeça vai rolar com esses prints divulgados?
É evidente que o princípio da inércia do Poder Judiciário foi rompido, o princípio da neutralidade ou da imparcialidade do juiz inexistentes, o polo ativo do titular da ação penal foi sequestrado, porque quando um juiz é vítima e ele figura o pólo ativo de uma ação ele não julga e é representado por um advogado.
Conforme apresentado na reportagem, o Ministro ‘cismava’ em melhorar e fazer o controle de alguns que ousavam, produzindo provas e controle sobre as redes sociais em nome da democracia inabalável (e, certamente, representando interesses de pessoas maiores). Parece que Alexandre de Moraes resolveu tomar para si as rédeas da democracia brasileira que já estava sendo corrompida e desconstruída pelos políticos brasileiros e resolveu ajustar os detalhes processuais para eliminar adversários políticos, conforme veiculou a Folha de SP.
Qual o próximo passo? Por que será que o ministro agora foi exposto e é descartável? Será que o Senado agora vai nos ‘salvar’? Ou o sistema está se reorganizando? Esse é o sistema que acabou com a lava jato e que ‘despenalizou’ Lula para a presidência da República. Se o Ministro sofrer processo de impedimento quem ocupará seu lugar? Um novo Flávio Dino?
A cisma! Caros, Juiz não cisma! Mas nós sim, e quem cismou agora?
A minha cisma é não acreditar no Governo e nos salvadores (nem nos que se dizem de direita).
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